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03/12/2025

A Morte de Ivan Ilitch - Leon Tolstói

A Morte de Ivan Ilitch Editora 34

Recentemente li meu primeiro Tolstói, a novela "A Morte de Ivan Ilitch". Resolvi lê-lo porque minha esposa também o leu recentemente e gostou da obra e isso me animou na leitura deste clássico da literatura russa lançado em 1886, portanto, 100 anos antes do meu nascimento.

Devo confessar que sempre fui um tanto "medroso" em ler clássicos da literatura por achar que seriam muito difíceis ou chatos. O mais próximo que cheguei disso foi ler alguns livros de Machado de Assis, como Memórias Póstumas de Brás Cubas, Senhor dos Anéis e algumas adaptações de clássicos da literatura para os quadrinhos.

Disto isto, não sabia muito bem o que esperar dessa leitura. Porém, ela me surpreendeu positivamente.

Fluiu muito bem, muito melhor até do que obras brasileiras do final do século XIX e início do século XX, como os livros de Machado ou Lima Barreto. 

Em certo ponto, isso foi obra também das boas notas de rodapé da edição da Editora 34 (com tradução do ucrâniano naturalizado brasileiro Boris Schnaiderman falecido em 2016), mas a linguagem utilizada como um todo foi bastante acessível para uma obra russa do final do século XIX.

A história começa com Ivan buscando desde jovem a galgar altos postos no sistema judiciário do Império Russo. Para isto, forma-se em Direito e vai começando de baixo, como "funcionário para missões especiais", cargo conseguido pelo "pistolão" do seu pai, até chegar ao posto do "Juiz do Tribunal de Justiça" em São Petersburgo, atingindo o ápice da sua carreira.

Toda a vida de Ivan Ilitch gira em torno da sua ascensão profissional. Descrito como um sujeito "agradável e decente", não tem nenhuma grande paixão na vida além de jogar ocasionalmente uíste e se destacar socialmente.

Até mesmo seu casamento foi pensado para ser "conveniente, decente e agradável". Sua esposa, Prascóvia Fiódorvna, é descrita por ele como "pertencente a uma boa família, não era feia e tinha alguns bens", qualidades boas o bastante talvez para comprar um carro ou apartamento, mas seriam corretas para se casar e constituir família? Para Ivan, sim. Era com esta visão pragmática que ele tomava as decisões mais importantes da sua vida.

No entanto, pouco tempo após o casamento e a primeira gravidez do casal, a relação entre eles muda e Prascóvia torna-se antipática, egoísta e desinteressada pelo marido.

Ivan, por sua vez, também não se identifica em nada com a esposa e os filhos. Para manter a fachada de bom pai de família, ele vive concentrado no que realmente gosta: no seu trabalho, nos seus estudos e nas suas partidas de uíste com seus poucos amigos do trabalho.

Entre altos e baixos, Ivan finalmente consegue seu grande cargo como Juiz em São Petersburgo e se muda para a cidade antes da família para poder decorar a sua nova casa como sempre sonhou, graças ao seu novo ordenado. 

Durante a decoração, sofre um acidente enquanto instala cortinas novas na sala e se machuca na altura do tronco e, apesar da dor, julga não ser nada demais.

Mas algum tempo depois, Ivan começa a sentir sintomas (um gosto estranho na boca, uma dor do lado esquerdo do abdômen, mau hálito) de uma doença que nunca é corretamente diagnosticada, sempre variando entre algum problema no rim ou no fígado, mesmo tendo consultado os melhores médicos disponíveis. 

Ivan Ilitch
Imagem de Ivan Ilitch gerada por IA

Ivan vai levando a vida como pode, até que não consegue sequer mais exercer a sua função como juiz, restando-lhe apenas o convívio familiar com uma família que ele não suporta, com exceção do filho mais novo e de um jovem criado.

Sofrendo com dores insuportáveis, Ivan não consegue mais sair do seu quarto, precisando de ajuda até mesmo para ir ao banheiro, restando-lhe apenas a companhia dos seus pensamentos e as desagradáveis visitas dos médicos e da esposa.

Desse modo, Ivan começa a repensar toda a sua vida e como chegou até aquela situação.

Encontrei muitos comentários dizendo que essa novela é uma reflexão sobre a morte, mas achei justamente o contrário: é uma reflexão sobre a vida.

Ivan Ilitch passou a vida inteira fazendo apenas o que lhe era conveniente e agradável para manter as aparências e cair nas graças daqueles que podiam ajudá-lo a ascender profissionalmente. Não escolheu uma mulher que amasse de verdade, não tentou melhorar seu casamento, não se aproximou dos seus filhos, é discutível até mesmo que tenha tido amigos de verdade, pois estes, logo após a sua morte, estavam muito interessados em saber quem ocuparia a posição de juiz deixada por Ivan.

Após a leitura, fiquei pensando se alguma vez cheguei a agir como Ivan Ilitch, ou seja, tomando decisões importantes apenas pensando na conveniência e na aparência delas. 

É impressionante como os russos do final do século XIX tenham tanto em comum com os brasileiros do século XXI: carreirismo, aparências, amizades por interesse e casamentos disfuncionais.

No geral, é uma leitura que acredito que vale muito a pena. É curta (por volta de 70 páginas), acessível e você fica ruminando por dias após terminada.




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