Memórias Póstumas de Brás Cubas foi um dos primeiros livros "adultos" que li na vida.
Certamente foi o primeiro romance, se é que assim podemos chamar as desventuras de defunto Brás.
Publicado originalmente como folhetim na Revista Brasileira no ano de 1880 com o nome de Memorias Posthumas de Braz Cubas e tendo deixado eterna uma das mais famosas citações da literatura brasileira, ou ao menos da Machadiana:
Ao verme
que
primeiro roeu as frias carnes
do meu cadáver
dedico
como saudosa lembrança
estas
memórias póstumas
Bem como também a famosa frase que fecha a obra:
Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria
Li pela primeira vez estas Memórias quando tinha entre 12 e 14 anos, me perdoem a minha imprecisão etária.
A coisa é que na época gostei muito da leitura, feita em uma daquelas edições de bolso bem baratas da Martin Claret em que o papel é quase transparente, a letra é minúscula e as capas eram tão horrorosas que o ChatGPT teria vergonha de tê-las produzido mesmo com o pior do Prompts.
Gostei tanto que na época eu achei um VHS do filme em uma locadora e aluguei e vi com a minha família na casa dos meus avós paternos.
O filme era estrelado por Reginaldo Faria, ator global, e o humor satírico, defuntico e em primeira pessoa me agradou demais.
No entanto, nunca mais retornei à obra, seja ela no papel ou nas telas.
Recentemente, navegando pelo site do rio Amazônico, me deparei com inúmeras versões de diferentes editoras para obras do Bruxo do Cosme Velho e reencontrei os escritos do velho autor desencarnado.
Pensei que já era hora de revisitar tão querida obra e também ter uma versão digna da mesma. A edição vencedora da minha licitação pessoal foi a da Editora Itatiaia. Preço bom, capa bonita, papel de boa gramatura, tudo como manda o figurino.
Só senti falta de textos de apoio sobre o autor (Machado, não o Cubas) e também um pouco de contexto da época, a história da publicação ao longo do tempo, etc.
Mas acho que por R$14,95 os editores da Itatiaia acreditaram que tais mimos seriam ir longe demais. Não os julgo.
Chegado o livro, era hora de debruçar-me e aproveitar a obra novamente. Após tanto tempo, seria praticamente como lê-la pela primeira vez.
Só que dessa vez achei-a chatíssima!
Brás Cubas (ou Machado de Assis) não consegue ser objetivo, o livro por muitas vezes é tedioso e desinteressante, como ambos os autores, real e ficcional, confessam:
Começo a arrepender-me desse livro. [...] o livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica [...] este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem...
Não poderia concordar mais.
O velho Brás não passava de um mimado filhinho de papai, um herdeiro com a vida ganha que nunca teve grandes preocupações na vida a não ser seus namoricos e paixonites agudas que levaram-no do nada ao lugar nenhum e fizeram seu pai e tios fazerem-lhe uma intervenção à lá Charlie Sheen (OFF: quem viu o documentário dele na Netflix pegou a referência) e mandá-lo à força para Portugal, a fim que fizessem faculdade e depois retornasse à Terra de Vera Cruz para seguir carreira, talvez até na política, nobre ofício, e elevar o nome da família Cubas a patamares jamais vistos.
Não bastante, seu grande amor tinha que ser uma mulher casada e com filhos, esposa de um político em ascensão.
Quase estragou a vida da dita cuja e ainda jogou a sua pela janela, pois não realizou nada digno de nota, a não ser a nota para dizer que não teve filho algum.
Lembro que muito tempo depois de ter lido este e outros livros do Machado de Assis, navegando pela ainda verde, livre e selvagem internet do início dos anos 2000, vi uma crítica do
Millôr Fernandes, outro ator que gosto muito (será que ainda gosto mesmo) e um dos responsáveis por tirar meu cabaço literário com livros herdados do meu falecido avô, que dizia que Machado de Assis era um bobo.
Lembro que na época fiquei chocado e decepcionado porque um dos meus autores preferidos - até então - criticou meu outro autor preferido - até então - e não só isso, mas criticou uma vaca sagrada da Literatura Brasileira.
Que bobo era eu. Por que Assis não poderia ser criticado?
Hoje, ainda não posso dizer que concordo que Machado de Assis era um bobo. Mas, sem dúvida, Brás Cubas era, tanto em vida quanto em defunto.
PS: Tem o filme completo no Youtube. Me lembrei de que no filme eles dão muita ênfase no emplastro. No livro mal falam disso. Ou seria um dos pequenos capítulos que eu pulei para terminar logo? Pode ser.
PS2: Já terminando de editar este post, descobri que o romance virou trend no TikTok no ano passado. Está aí o link para quem quiser conferir. Fiquem tranquilos que ninguém fez dancinha.

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